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DESTINO E LIVRE-ARBÍTRIO...
CARMA E DHARMA:
TECENDO A TRAMA DO FUTURO

Frater Cronos

O destino é um velho conceito que norteia a todos aqueles mais ligados às doutrinas e filosofias ditas esotéricas. Poderia até dizer que é um conceito que "preocupa" a todos os dogmas religiosos ocidentais. Através de uma explicação simples, alguns tentam doutrinar o destino e outros tentam escapar dele. Existem teses mirabolantes sobre o tão citado e uraniano Livre-arbítrio e outras mais ainda sobre o saturnino Carma.

Após uma profunda meditação e alguns estudos, percebi que ambos conceitos são freqüentemente abordados de forma errônea e distorcidos pela mente ocidental. Para explicar o porquê dessa afirmação seria necessária a disposição de alguns conceitos fundamentais dos quais se originaram esses termos.

De onde se originaria Destino, como conceito. Provavelmente estamos falando do Destino grego, filho da Noite: obscuro e invisível, regendo a homens e deuses. Aquele a quem nem o próprio Zeus poderia se opor. Zeus detinha a sabedoria suprema e sabia que se desafiasse o Destino, iria contra a ordem do Cosmo, pela qual ele mesmo zelava. As Moiras e Tique seriam as auxiliares do Destino. As Moiras, filhas de Zeus e Têmis, eram Cloto, a fiandeira que tecia o fio da vida de todos os homens, Láquesis, a fixadora que determinava o tamanho e enrolava o fio, estabelecendo a qualidade de vida que cabia a cada um, e Ártropos, a irremovível, que cortava o fio quando a vida que representava chegava ao fim. Como deusas do Destino, as Moiras presidiam os três momentos culminantes da vida humana: o nascimento, o matrimônio e a morte. Já Tique seria a Fortuna para os romanos, aquela que visitava os homens, trazendo-lhes a felicidade ou a desgraça.

Percebe-se, então, que o Destino tem seus ajudantes, aqueles que determinam como, onde e quando os fatos devem ocorrer, dão seu juízo e veredicto sobre os homens e determinam como viverão, onde e como morrerão. Essa função seria presidida pelas Moiras/Parcas. Já Tique/Fortuna visitaria os homens para presenteá-los ou trazer-lhes o infortúnio. Essa seria, em linhas gerais, a visão dos gregos do que seria o Destino.

O Destino era a principal força organizadora do Caos. Existe uma corrente de estudos de magia sobre o Caos e a Ordem. O Caos é a força primordial e criativa, a Ordem é a retenção do Caos, que dá forma a todas as coisas existentes. A luta entre o Caos e a Ordem é interminável, mas é necessária.

Vamos à origem do termo Carma. Ele é terrivelmente mal aplicado, compreendido e conceituado. Principalmente pelo espiritismo que o tem como um de seus fundamentos. O Carma se distanciou do seu real sentido oriental de onde foi inspirado, sendo agora o principal gerador dos males da humanidade, o verdadeiro substituto do Diabo. O mais importante quanto ao conceito do Carma é o seu oposto, ou complementar, o Dharma, que seria a missão que cada um deveria executar. Mais profundamente, o Dharma demonstra a vontade cósmica, a vontade do Todo, ou, no final das contas, a velha palavrinha Thelema. Cada ser do universo, ou cada estrela, tem sua parte nessa vontade. A somatória de todas essas vontades constituiria a vontade do Todo. Portanto, todas a vontades são individuais e complementares, não existindo vontades iguais ou conflitantes.

Esse Dharma, uma vez ameaçado, causaria a volta do deus Vishnu (Ordem), o conservador, aquele que constitui uma trindade juntamente com Bramam, o criador (Caos), e Shiva (Caos), o destruidor. Foi numa dessas voltas de Vishnu, numa de suas reencarnações, ou mais precisamente na forma de avatar, que ele nasceu como Krishna.

Mas o que seria realmente essa ameaça ao Dharma? Ir contra a vontade universal gera uma energia contraposta de reposição ao sentido original do Dharma, uma energia de ação no mesmo plano da ameaça. Essa energia é conhecida como Carma. Vishnu seria, portanto, o senhor da conservação do Universo, agindo como o Carma que repõe a ordem universal.

Temos de descobrir nossa vontade, porque não temos direito a não ser fazer a nossa própria vontade. Toda a energia empregada em descobrí-la, volta em proveito de nós mesmos. O Carma, nesses termos, seria a energia gerada por não procurarmos seguir ou pelo menos encontrar nosso Dharma. Dessa forma, o Carma não seria uma energia punitiva ou negativa. É apenas uma energia corretiva e moldadora do espírito. Ele nos molda para melhor chegarmos ao Dharma, para melhor sermos permeados por ele.

Atingirmos o nosso Dharma é penetrarmos no Absoluto, chegar próximo e ser um com o Todo. Uma vez nesse real caminho, estamos penetrando na comunhão com todos os seres, estamos em sintonia com eles.

O Dharma e o Carma são partes de uma só ação, ambos são duas partes de uma mesma verdade. Para entendermos a conservação imposta por Vishnu, temos de apelar para o velho princípio hermético da polaridade. Ambos são duas faces da mesma moeda, a mesma energia, a mesma origem e o mesmo fim.

O Universo é composto por duas grandes energias opostas, a criativa e a destrutiva. Essas energias dão forma a tudo e são uma só coisa. O homem para fazer a volta para o local de sua origem, deve se criar e destruir continuamente. Esse é o principio final da vibração, onde tudo é movimento. E essa energia de criação e destruição, que são a mesma coisa, deve ser mantida. Da mesma forma, a energia do Dharma passa para energia cármica e volta a ser do Dharma. É a pendularidade. São expressões de uma mesma realidade, que tem por fim a manutenção do cosmo em eterna evolução.

Depois dessa explicação, é possível de se notar que o Carma e Destino são coisas diferentes. Dharma e Carma são energias de conservação, de ordem, e não de determinação.

Muitos dizem que o Carma deve ser algo punitivo, que vem para nos punir por nossos erros. Mas a função do Carma não é essa. Ele existe para nos colocar no melhor caminho para atingir o nosso Dharma. Para vencermos esse universo em gestação e destruição, para nos incorporarmos nele. Sendo o Dharma realmente uma energia para a nossa vontade, ele nos leva a vencermos a nós mesmos, para nos jogar de encontro à luta contra nossos monstros e demônios interiores que nos aprisionam. Somos os reais punidores, pois permanecendo inertes a esse domínio, permanecendo nessa ignorância, nosso sofrimento se agrava. O maior inimigo do homem é ele mesmo. Sendo o homem inimigo de si mesmo, ele deve ser vencido. Vencer as máscaras que encobrem a divindade humana, aquela que o faz escravo. Segundo Buda, o sofrimento vem de nós mesmos, pois nós o causamos. A nossa vontade não pode ser outra do que sair dessa terrível escravidão. Agindo conforme nossa real vontade, temos domínio sobre o nosso destino.

Haveria então um livre-arbítrio? Seria isso real? O homem não tem outro direito do que fazer a própria vontade. Realmente existe esse livre-arbítrio. Mas ele nos prende na escravidão, porque achando-nos livres, podemos ser dominados por nosso íntimo ou por inimigos internos. A vontade do homem é suprema, ela confere a real liberdade. Aqueles que se oporem a ela, nesses termos, devem ser mortos. Mortos como Arjuna matou seus parentes. A Lei do Forte, a alegria do mundo, aquela que liberta da escravidão e de qualquer inimigo, que vá contra a vontade do homem que é também a vontade do Universo.

Devemos matar a um semelhante que vai contra nossa vontade? Não exatamente. Devemos matar os inimigos de nossa real vontade, aquela que possamos nem conhecer. Devemos matar os inimigos daqueles que vem contra nossa evolução e progresso, que vai contra a vontade do Universo. Esses inimigos podem ser reais ou imaginários, podem ser doutrinários, podem ser institucionalizados. Mesmo o livre-arbítrio, esse colocado contra nós mesmos, deve ser vencido.

Depois desses conceitos todos, podemos afirmar que os eventos de uma vida passada seriam os causadores do infortúnio dessa vida? Seriam nossos pecados ou erros, aqueles frutos de nossa própria e infeliz ignorância, os geradores de inconvenientes para nós? Se o homem tem por missão chegar a divindade que ele mesmo porta, quanto mais errarmos, mais tempo o levaremos. Quanto mais tivermos a ignorância da própria vontade, mais estaremos presos na corrente da escravidão e mais sofrimento teremos a nos prolongar na busca. Devemos inclusive amparar o próximo na busca, para que ele não se coloque à nossa frente, nem queira ir contra a vontade universal.

Muitos acham que questionar a religião e os dogmas instituídos são formas de pecado. Se esses dogmas estiverem errados e forem formas de mais escravidão, não praticar esse pecado é tolher a si próprio e ser inimigo de si mesmo. Portanto, pecado é palavra de restrição.

Quando mencionamos a palavra Destino, todos pensam que é uma forma de se determinar o futuro. Que o futuro pode estar marcado. Claro que está, nós o marcamos. Quanto mais somos violentos, mais a violência se voltará contra nós. Se somos ignorantes de nossa vontade, mais ela tentará se manifestar, de forma a que tomemos consciência de que ela existe e deve ser descoberta. Colhemos o que realmente plantamos.

É algo simples para quem lê o Tarot entender como o futuro se processa. Muitas vezes fui surpreendido de como as leituras a respeito do meu próprio futuro seriam flutuantes. Cheguei a pensar no princípio, que as leituras seria faces diferentes de uma mesma realidade. Mas infelizmente não são. São mudanças de rota, tendo em foco mudanças minhas de atitude ou de idéia mesmo. Entretanto, alguns fatos insistiam em permanecer registrados, até realmente ocorrerem. Em vários estudos li sobre meu passado e percebi que as leituras, nesse caso, insistiam em mostrar os mesmos fatos, ou em mostrar outras faces.

Olhando para as Moiras gregas, podemos perceber que elas realmente não deixavam o momento da morte de uma pessoa predeterminado. Após um julgamento, elas determinavam o fato. O futuro nunca estaria decidido. Mesmo o próprio Destino não marcava o futuro, apenas regulava o presente, para com sabedoria criar um bom amanhã. Mas, uma vez determinado, seria implacável.

Dessa forma existe uma concepção muito interessante sobre o destino, aquela do arqueiro. Ele tem três flechas. Uma está no alforje, guardada, para quando o arqueiro quiser lançá-la. Outra está no arco e ele mira, pode disparar para onde quiser e se quiser. Outra já foi disparada, é impossível deter sua trajetória.

O homem tem um desejo interior enorme de saber qual seria o seu futuro, mesmo que esse fundamentalmente não esteja traçado. Existe uma velha história que ilustra bem esse fato. Dizem que Ifá estava muito pobre. Ele um dia encontrou com Exu, o único que vivia em espírito. E chorou suas mágoas para Exu, dizendo que estava muito pobre e sofrendo muito por isso. Exu ensinou a ele o jogo de Búzios. E disse para que ele sempre cobrasse para utilizá-lo (por isso que se cobra a consulta). Anos depois, Ifá estava muito rico e encontrou novamente com Exu. E disse estava muito agradecido a Exu por ter ensinado a ele os Búzios. E Exu disse: "O homem é um tolo, por que quer saber o futuro. Então ele sofre duas vezes. Quando sabe e quando acontece."

Podemos discutir qual vantagem de se conhecer o futuro. Muitos profetas dizem que revelam o futuro porque ele realmente não está traçado e pode ser mudado. Seria isso o destino ou um simples encadeamento de fatos? Seria a velha lei da causa e efeito hermética jogada para a frente?

Evidentemente, teremos num mapa astral uma interessante ferramenta para traçar o futuro. Não podemos ver o que vai acontecer, mas com um pouco de inteligência, observando as pessoas as quais estamos focalizando, podemos prever que sob determinada influência exista a propensão de ocorrer determinada coisa. O mesmo uso eu faço do Tarot. Infelizmente, certas propensões costumam insistir em ocorrer, mesmo que o aspecto antes favorável para o acontecimento mude. Isso é algo para se pensar com cautela. Não seriam esses fatos que insistem em ocorrer algum planejamento anterior? Não poderíamos nós planejarmos nossas vidas antes de nascer? Não percebi nesses fatos que estariam previstos e que até chegaram a ocorrer, algo como cármico, determinado como meio de punição ou recompensa. Percebi como fatos que norteariam uma pessoa, fatos relevantes para que a vida seguisse seu melhor curso. Bandeiras indicando o melhor caminho.