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PLUTÃO, O QUE ACONTECEU AFINAL?

Alexey Dodsworth

Você deve se lembrar das vezes em que, passando o olho numa revista qualquer, se deparou com uma reportagem em que um grupo de cientistas de uma universidade de nome estranho, após minuciosas pesquisas, comprovou que o ovo faz mal; em seguida, talvez não muitos meses após, leu em outra revista que outro grupo de cientistas de outra universidade de nome mais estranho ainda, após não sei quantas experiências, comprovou que o ovo faz muito bem! Não apenas os ovos são alvo das determinações que soam como definitivas, qualquer coisa serve: silicone, cremes pra cabelo, água, sol, vitamina C e agora até Plutão. Muitas pessoas ficaram realmente chocadas com as últimas novidades da União Astronômica Internacional. Mais chocado fico eu, com a reação delas. Parece que se esqueceram das pesquisas envolvendo o ovo. Parece também que se esqueceram que não é a astronomia quem determina os caminhos do saber astrológico.

Primeiramente, vale salientar que Plutão não deixou de ser um planeta. Ele passou a ser considerado um "planeta anão". Grande coisa. Eu nunca precisei de uma análise minuciosa para saber que Plutão era minúsculo. Qualquer livro de ciências do ginásio demonstra isso. O mais falado astro das análises catastrófico-astrológicas não virou asteróide, não virou cometa, não é considerado apenas um pedregulho e não foi "retirado do sistema solar". Ele continua a ser planeta. Mas é anão. E daí? No que isso muda para a astrologia?
Nada. Não muda absolutamente nada.
E poderíamos perguntar: no que muda para a astronomia? Aparentemente, os livros de ciências terão que mudar. Mas, ao contrário do que alardeiam as más e rasas publicações, Plutão não será excluído. Continuará onde sempre esteve, ganhando apenas o adjetivo "anão" para acompanhá-lo. Ganhará uns amiguinhos, é claro: Xena (o astro de nome de gosto duvidoso) e outros novos planetas. Planetas anões, devemos dizer, para não ofender os brios dos puristas. Mas, mesmo assim, planetas.

Um segundo argumento, este totalmente astrológico, vem lembrar aos estudantes que a astrologia sempre se valeu do Sol e da Lua em suas interpretações e nem o primeiro e nem o segundo astro são "planetas" para a astronomia. São, todavia, planetas para a astrologia. O termo "planeta", conforme concebido pelos primeiros cientistas (na época chamados de "filósofos naturais"), significa literalmente pequeno plano. Cada astro que nos ocupamos de estudar simbolicamente possui, consigo, um plano. Por isso Sol e Lua também são chamados de "planetas" pela astrologia, ainda que esta nomenclatura não seja válida dentro de princípios astronômicos. E, que eu saiba, nenhum estudante de astrologia saiu da aula de iniciação pensando que o Sol é um planeta no sentido astronômico do termo. Ainda que Plutão deixasse de ser chamado de "planeta" (o que não é o caso) e passasse a ser chamado de "asteróide" ou "alcachofra", para a astrologia ele continuaria a ser o que sempre foi: o corpo celeste com todos aqueles significados que tanto nos incomodam e perturbam. Eis a ironia astrológica da coisa: quase todo mundo fala tão mal dos significados plutonianos e na hora em que pareceu que lhe seria tirada a importância, poucos foram os que não se revoltaram. Eis também a ironia astronômica: planeta é já um termo que, por si, significa um diminutivo. Conforme citei anteriormente, um "pequeno plano". Plutão passou a ser considerado, pelos cientistas, um planeta-eta (agora com eco!) ou, falando em português sofrível, um "planinhozinho".

Um terceiro ponto a ser considerado diz respeito às regências. Ficaria Escorpião sem regente, caso Plutão fosse, digamos, transformado numa alcachofra pelos cientistas? Claro que não! As pessoas se esquecem que o Zodíaco sempre teve um modelo totalmente satisfatório, em que cada planeta possui seu domicílio diurno e seu domicílio noturno, salvaguardando o equilíbrio simbólico de luz e treva que deve haver em tudo. Marte, portanto, é o regente de Escorpião, como sempre foi há cinco mil anos, assim como Saturno rege Aquário e Júpiter rege Peixes. As atribuições modernas de regências não devem ser excluídas, é perfeitamente possível e razoável dizer que Plutão também rege Escorpião, que Urano também rege Aquário e que Júpiter também rege Peixes. Mas isso sem jamais esquecer as regências tradicionais. Não faz mal estudar um pouco de astrologia antiga. Ela assusta mas não morde, nem é radioativa. Chega a ser imprescindível o estudo da arte antiga, caso contrário perderemos completamente o senso daquilo que nós mesmos praticamos.

Por fim, resta refletir a respeito de por que algumas pessoas dão tanta importância a uma determinação astronômica. Nada contra a astronomia, muito pelo contrário, particularmente gosto tanto dela que um dos meus planos é estudá-la na Universidade. Mas o fato de amar a astronomia não me faz confundir alhos com bugalhos, nem planetas com baratas. Não é a astronomia, repito em negrito, não é a astronomia quem determina o que é válido em astrologia. Talvez o que assuste muito as pessoas é o "peso" de uma afirmação ser feita por cientistas. A alta estima que temos pela ciência não está restrita apenas à vida acadêmica, ela impregna o nosso próprio dia-a-dia. Quando uma pessoa quer defender uma área que aprecia, costuma acrescentar o termo "ciência" a ela, a fim de lhe conferir peso e substância. Temos agora a Ciência Bibliotecária, a Ciência Gastronômica, a Ciência Espírita, a Ciência dos Alimentos e até mesmo a Ciência Mortuária (que deve ser regida pelo planeta-anão). O que é científico parece ter peso. Isso me faz lembrar aquele filtro solar que as pessoas compram só porque tem o FATOR AZUL, algo obviamente criado pelos cientistas. Se alguém um dia souber o que é um FATOR AZUL e para que serve, por favor me explique. Meu e-mail está ao final deste artigo. Mas que a coisa vende, vende, afinal usa terminologias científicas em seu merchandising. A coisa está virando moda. Um toque: quer enrolar alguém? Diga que seu argumento é científico. Quase todo mundo engole. A ciência assumiu valor de Deus. Parece ser inquestionável, imbatível. Segundo o filósofo da ciência Paul Feyerabend, é mais do que claro que a escolha entre teorias e as definições científicas se reduzem a opções determinadas por valores subjetivos e desejos individuais. Não existe esta "determinação científica objetiva" que muitos querem crer. E isso fica evidente de uma forma notável na reunião dos astrônomos em Praga.

O que muita gente não sabe é que nem todos os cientistas concordam com o aparente "rebaixamento" de Plutão. Apenas uma pequena quantidade de membros da União Astronômica esteve presente à votação, que foi feita à revelia dos demais membros. Vários estão furiosos com a decisão, como o astrônomo americano Owen Gingerich que até hoje reclama que a votação de Praga foi "sequestrada" por colegas de visão estreita. Uma profecia: ainda teremos notícias. O ovo faz mal numa pesquisa, depois faz bem em outra, lembrem-se. Cientistas não são tão "certos" do que dizem quanto parece. Felizmente, eles mesmos sabem que não são donos da verdade e têm o poder de mudar de idéia. Diante deste festival de ironias, a mais gritante de todas talvez seja o fato dos cientistas mais empenhados em ofender Plutão, chamando-o de "anão", serem uruguaios. Aparentemente, ficaram felizes por chamar a atenção da comunidade científica sobre o Uruguai. Julio Fernández e Gonzalo Tancredi se opuseram ao modelo de um sistema solar com doze planetas, e preferiram instigar os cientistas a "rebaixarem" Plutão. As opções na reunião de Praga eram claras: ou aumentamos o número de planetas, ou tiramos de Plutão sua importância. Venceu o lobby dos uruguaios. De vingança, poderíamos reunir uma tropa de escorpianos para votar que o Uruguai, por suas dimensões diminutas, não pode ser considerado um país, e sim um país-anão. Seria gostoso, mas não faria diferença alguma no final das contas. Como bem disse Maria Eugênia de Castro numa recente entrevista televisiva, "não é porque um sujeito é anão que ele não é humano". Pois é, está certíssima! Plutão é anão, mas é planeta. O Uruguai é minúsculo, mas é país. E Julio e Gonzalo, pelo visto, ainda não aprenderam que o que importa não é o tamanho, e sim o desempenho...