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IATROMATEMÁTICA: A ASTROLOGIA DA CURA CONSCIENTE
E A ALMA DA MATÉRIA

Alexey Dodsworth

No decorrer da Idade Média, os médicos das Igreja, de Alberto Magno a São Tomás, assim como outros, aceitaram a arte e as técnicas astrológicas. Os estados psíquicos e morais, mais do que as constituições corpóreas individuais que os astros e aspectos configuram, eram entendidos como tão reais quanto os dedos que digitam este texto. E estas formas podem ser entendidas como arquétipos ou símbolos ou como uma "assinatura" de fatos e processos reais, num modo similar à argumentação do herbaristas que diziam, por exemplo, que a planta Euforbia tem analogia com o olho por sua forma e sua cor. Na verdade, estes médicos da Igreja reconheciam a realidade das analogias astrológicas. O ânimo humano, as inclinações e a disposição individual mais do que naturalmente tinham uma relação com o movimento do céu. Se considerava, em outras palavras, que o corpo, não podendo ser animado simplesmente por si mesmo, era estimulado por uma alma, e a natureza desta alma podia ser revelada pelos movimentos celestiais. Mas, preste atenção: "revelada" não significa "influenciada".

Uma das mais controversas questões no meio astrológico diz respeito às duas correntes ou visões acerca da astrologia: a causalista e a holística.

Dentro de uma perspectiva causalista, os astros seriam emissores de uma energia desconhecida que desencadeariam "efeitos" no mundo material. Resultado de um pensamento mecanicista, este conceito dos "astros influenciando" tem sido um dos maiores estimuladores da chamada "inércia astrológica", em que o indivíduo tão simplesmente justifica os acontecimentos e suas falhas a partir de um "algo externo" que é o suposto causador de fenômenos, sejam eles "bons" ou "maus". Este modo de pensar cria uma dicotomia, estabelecendo "alma" e "matéria", "homem" e "céu", "nós aqui em baixo" e "os planetas lá em cima".

A visão holística, diferente da causalista, não considera os planetas como emissores de energias que influenciam. Dentro da perspectiva acausal, os astros não influenciam nada. Seriam como ponteiros de um grande relógio cósmico, revelando a natureza dos seres e eventos nascidos num dado momento. Desta forma, como dizia Paracelso, "o homem é ceu, o homem é terra, o homem é tudo o que há no Universo".

Partindo deste raciocínio, quando falamos em "Marte" não estamos nos referindo apenas ao planeta vermelho, mas também nos referimos ao sangue, ao ferro, ao alho, e as analogias beiram o infinito. A visão de um planeta lá no alto influenciando a vida aqui na Terra literalmente cai por terra, com perdão do trocadilho. Ainda no exemplo de Marte, ele estaria no céu, no planeta Terra e circulando dentro de nós como o sangue. Estaria no ferro, nos lobos, estaria na cor vermelha.

A visão holística então resgata esta unidade da natureza, e isso pode ser aproveitado para uma visão eficaz da astrologia como uma prática de cura. A partir desta perspectiva, elementos analógicos são utilizados para curar aquilo que está excessivo num mapa. Todo vício é uma virtude que perdeu a paciência, ou por assim dizer, uma "virtude que exagerou". O ciúme é o excesso do zelo, a falsidade é o excesso de diplomacia, a estupidez é o excesso de honestidade. Não existe distúrbio que não nasça de uma virtude. Não seria portanto possível "neutralizar" um defeito ou distúrbio sem matar a qualidade. O caminho seria o de devolver a qualidade à sua proporção saudável. Do mesmo modo, a homeopatia nos revela que a diferença entre veneno e remédio é a dose.

E a astrologia atual cumpre este papel de instrumento de cura?

Muitos astrólogos se desagradam ao verem a astrologia definida como "entretenimento" em alguns sites de busca. De fato, com algumas raras exceções, o astrólogo tem cumprido muito mais um papel de figura que entretém do que o de um efetivo terapeuta. Falar sobre a personalidade dos outros, adivinhar o que elas gostam ou não gostam não é apenas fácil para um astrólogo, como também é excitante e divertido para quem escuta. As pessoas gostam que se fale delas, e isso é inerente à natureza humana. E o que é isso, senão entretenimento?

Há, todavia, uma possível utilidade para esta capacidade da astrologia de descrever a natureza das coisas: o potencial de desencadear um processo de aperfeiçoamento, de movimento de alma, em que o indivíduo se impele para uma dinamização, uma otimização de sua própria natureza.

OS 4 CAMINHOS...

Existem quatro caminhos possíveis para aquele que se vê diante de uma descrição astrológica:

O primeiro leva a lugar nenhum além do mero entretenimento, ou pode até mesmo ser nocivo, na medida em que estimula o reforço das características. A chamada "astrologia da justificativa": "sou ciumento mesmo, porque tenho Vênus em Escorpião", ou "eu como muito mesmo, porque tenho o Ascendente em Touro". Em todos estes raciocínios, verifica-se a indolência de quem se satisfaz com a manutenção de um padrão, ficando à mercê do lado inferior de sua própria existência.

Pode, entretanto, ser uma astrologia inofensiva, uma astrologia de festa, que satisfaz o ego de quem precisa de atenção, de que falem dele.

O segundo caminho é a Via do Sol, em que a consciência provoca uma libertação. Por incrível que pareça, uma quantidade enorme de pessoas é simplesmente inconsciente de si mesma. Elas não têm a menor idéia de determinados vícios, até que entram em contato com informações transmitidas pelo astrólogo e, subitamente, "se tocam". Para a via solar, o simples ato de tomar consciência de um processo liberta o indivíduo daquele processo. Infelizmente, seguir esta via é coisa rara. Na maioria das vezes, o indivíduo se depara com sólidas interpretações astrológicas, e lança a fatal pergunta:
- E aí, o que é que eu faço pra melhorar?
Diante de uma pergunta assim, o que o astrólogo pode fazer? Aconselhar? Dizer "tente não ser tão rabugento/ciumento/fofoqueiro/pessimista" ou qualquer outra coisa? Infelizmente, todos sabemos que nem sempre nos é possível seguir a via solar, da consciência libertadora. E porque algumas pessoas (em alguns momentos) conseguem se libertar de si mesmas apenas pela consciência, ninguém sabe. Muitas vezes o indivíduo tem pouco estudo, não é alguém "notável" no sentido intelectual, mas a via solar se abre diante dele, e uma consulta astrológica pode ser incrivelmente estimulante. A consciência que liberta.

A maioria de nós tende a seguir pela Via da Lua, em que a luz do Sol também nos é oferecida, mas de forma indireta e flutuante: aos poucos, e de forma não necessariamente estável. Vislumbramos a luz da consciência, mas de uma forma tênue, como que diante de uma Lua Cheia, afinal nem todos temos a capacidade de olhar diretamente para o Sol. Esta luz flutua, como a Lua. Em alguns momentos, melhoramos. Noutros, decaímos. Avançamos e retrogradamos, assim como a Lua que alterna seu movimento no céu, refletindo parcelas da luz da consciência. Em alguns momentos estamos na meia-luz, em tantos outros nos sentimentos cheios de consciência, mas ainda assim aquela "luz" não passa de um pálido reflexo da intensa vibração solar.

Há outra via, que é o "caminho da ponte". E quem faz a ponte? Mercúrio. A Via de Mercúrio tem como guia o caduceu de Hermes, o símbolo da medicina. Antigamente, a astrologia fazia parte do estudo médico. E, de fato, se pensarmos atentamente, o mapa astral é um excepcional instrumento de diagnóstico. O astrólogo, um intérprete, aquele que entende a língua do céu. O mapa astral diagnostica, mas nos foi retirado o potencial de curar. Porque apenas falamos das analogias, mas não nos é permitido - legalmente falando - manipular os elementos naturais que encontram sintonia com nosso céu interior. Atualmente quem cumpre este papel é o homeopata, muito embora na massiva maioria das vezes desprovido do fantástico instrumento de diagnóstico que é a astrologia (que encurtaria o entendimento e a anamnese do paciente).

E a IATROMATEMÁTICA vem a ser este "caminho de Mercúrio". "Iatro" significa" cura", e "matemática" também vem de "mater", ou "mãe", "matéria". Poucas pessoas sabem, mas um IATROMATEMÁTICA era como eram chamados os astrólogos, antigamente. Quando a astrologia era um instrumento de cura, e não apenas uma forma de adivinhar as coisas. O mapa era um INSTRUMENTO DE DIAGNÓSTICO, em que um perfil era delineado, a fim de que fossem observados os desequilíbrios e quais elementos da natureza (a matéria) seriam úteis para trabalhar a cura pessoal ("iatro").

O astrólogo não deveria ser apenas alguém que lê o céu, mas aquele que encontra o céu na Terra, aquele que abre o canal da cura. Que descobre Marte nas plantas, que encontra a Lua em alguns minerais, que vislumbra o Sol no ouro e, diante de tais substâncias, realiza a opus alquímica, equilibrando os humores daqueles que o consultam. Revelando, por fim, que ao mexermos no elemento estamos também lidando com aspectos de nossa alma. Sem diferença entre o externo e o interno.

E não pode haver diferença: o céu é onipresente, e onde está a Terra? No céu.