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A MEDITAÇÃO NO DIA-A-DIA ::: Parte I
"OS ESTADOS DA MENTE E A CONQUISTA DO SER TOTAL"

Paula Salotti

Meditar é estar plenamente aqui e agora. É inspirar e expirar o momento presente. Compreender que tudo que surge é necessário e essencial. Aprender a parar. Parar e tomar consciência do corpo, do milagre da respiração que nos presenteia com a força da vida a cada instante. Meditar é respirar consciente. Caminhar consciente. Comer consciente. Viver consciente. Plenamente.

Levar a experiência da meditação para a vida diária, estar em meditação a cada instante, em cada situação, permitindo que o contato com essa fonte incessante de energia transborde por todo o nosso ser para cada momento da nossa vida.

Somos plenos em essência e nascemos conectados a nossa essência divina. Mas com o passar do tempo camadas e camadas dos mais diversos condicionamentos nos distanciam da nossa real natureza. Passamos a ser o que os outros esperam que sejamos, sufocando nossa identidade e essência. Essas camadas de condicionamentos nos anestesiam e hipnotizam, até que o caminho do auto conhecimento nos sintonize novamente com a essência divina.

A prática da meditação é uma maravilhosa ferramenta para acessarmos esse eu divino, onde encontramos a fonte de todo conhecimento e criatividade - reservatório infinito de energia e amor.

Esse caminho muitas vezes é solitário e exige coragem e audácia, já que precisamos romper muitas barreiras e quebrar padrões e hábitos profundamente enraizados. Quanto mais camadas de condicionamentos são "descascadas" mais deixamos de ver sentido em atividades que antes nos serviam apenas como muletas, ou mesmo em pessoas ou situações que mantínhamos ao nosso lado por carência e insegurança.

Quanto mais tocamos esse núcleo do nosso ser mais mudamos a perspectiva pela qual enxergamos a vida, criando a grande transformação. Nada mais será como antes... O interessante é que tudo continuará igualzinho como sempre foi, mas o mais importante haverá mudado: o nosso interior. Mudando o interior, a relação com tudo e todos muda, o exterior muda e até as coisas aparentemente "imutáveis" mudam também. Por exemplo, se há uma dor crônica, uma doença incurável, um relacionamento impossível de ser afastado, ao mudarmos nosso enfoque, nossa sintonia, naturalmente nossa relação com a situação mudará - a aceitação, a consciência do aprendizado que surgirá não no nível teórico, mas vivencial, fazendo com que uma situação que antes nos desequilibrava passe agora a nos ensinar, despertando a gratidão infinita por tudo e todos que atraímos.

DIFERENCIAR MENTE DA CONSCIÊNCIA, ISSO É MUITO IMPORTANTE NA MEDITAÇÃO!

Quando nos sentamos para meditar, ao contrário do que muitos pensam, não estamos numa situação passiva. Isso é uma das várias interpretações da mente concreta, que não tem muito interesse que entremos no estado de meditação. Nossa mente concreta, racional, é maravilhosa em diversas situações da vida, mas não quando queremos acessar espaços profundos. Acostumada a ser soberana, ela no início não aceitará ser destronada com tanta facilidade e fará tudo que puder para manter o seu posto! Por isso, todos os obstáculos que encontramos para meditar têm origem na luta da mente racional, impedindo a dissolução do ego no Ser Total.

Para que qualquer movimento em direção a meditação seja feito, temos em primeiro lugar que deixar a mente racional de lado. Por isso falar sobre meditação, aprender, ensinar etc, são experiências válidas para que tenhamos um primeiro contato com a prática, mas nunca serão plenas.

Fazer um curso de meditação, ler um livro, ouvir a experiência de alguém, apenas alimentará a mente concreta com mais e mais dados, mas criando enorme distância do contato direto que só teremos na prática. A experiência da meditação - como a vida - é única a cada instante. Uma meditação jamais será igual a outra. Por isso ninguém pode ensinar meditação. Podemos ensinar ou aprender técnicas que facilitam o desligamento da mente racional, mas a experiência em si é única, pessoal. Aprender meditação seria o mesmo que aprender com alguém a dormir, por exemplo. Por mais teorias que possamos ouvir, só saberemos o que é dormir... dormindo! Ninguém poderá dormir por nós ou traduzir a nossa experiência ao dormir.

ONDAS CEREBRAIS

A mente sempre aparece como a grande vilã da prática da meditação. Os pensamentos borbulham sem pedir licença, nos distanciando daquela imagem que criamos de um ser sereno, meditando como se tivesse conseguido zerar o seu diálogo interior.

Vamos entender que meditar não é parar de pensar, mas mudar a relação com os pensamentos. É a função da mente produzir pensamentos, assim como é a função do coração bombear sangue, a dos rins filtrar impurezas, etc. Nem por isso precisamos monitorar o coração, os rins, o fígado, dizendo a eles o que fazer. Simplesmente e involuntariamente cada um cumpre o seu papel e as batidas do coração ou os barulhos do estômago não nos incomodam.

Mas os pensamentos incomodam porque damos excessiva importância a eles. Retemos o pensamento, dialogamos com ele, criando a comum associação de idéias que nos coloca num estado superficial. Quando nos damos conta do diálogo, tentamos "não pensar". Aí está o grande erro! A mente reprimida fica mais inquieta. Só quando entendermos que "pensamentos" nunca deixarão de ser "produzidos" pela mente, relaxaremos e nos desligaremos. Eles não mais atrapalharão a meditação. Continuarão a surgir, desmanchando-se no nada. Vamos entender esse processo, mapeando nossas ondas cerebrais.

Em vigília, nossa ondas cerebrais variam de 14 a 28 ciclos por segundo. É o chamado estado beta. Precisamos estar em beta para atuar no plano concreto, agir, decidir, etc. Mas as ondas betas tem suas desvantagens. Elas são alimentadas por estímulos externos e acabamos viciados em ficar em beta. Todos os estímulos que recebemos desde o nascimento reforçam a necessidade e o hábito de estarmos em beta. Imagens, música alta, letreiros, barulho, etc, estimulam a mente, mas também são fontes de stress quando não conseguimos viver sem eles.

O vício de ondas beta nos leva a repetição mecânica de hábitos. Por exemplo, se a mente estiver viciada em beta, ao entramos em casa após um dia agitado, mecanicamente vamos falar ao telefone, ligar a televisão, o rádio, o computador, comer, alimentando nosso ser com mais e mais estímulos externos, impedindo que a mente "pare". Parar é entrar em alpha, quando as ondas passam a variar entre 14 e 7 ciclos por segundo, nos colocando em contato com a mente subconsciente.

E entrar em alpha é muito fácil, basta prestarmos atenção a respiração para que as ondas cerebrais comecem a ser reduzidas. Em alpha começamos a acessar um estado de serenidade, relaxamento e desprendimento das exigências externas.

É vital para nossa saúde física e psíquica equilibrar atividade e repouso, em outras palavras, ondas beta e alpha. Tão vital que fazemos isso instintivamente quando paramos no meio do dia olhando para o nada, nos desligando por uns instantes da turbulência. Se não fizermos isso com certeza iremos explodir com alguém em poucos instantes. Portanto, acessar alpha é começar a entrar em contato com a profundidade do nosso ser intuitivo, relaxado.

Se conseguirmos relaxar bastante, nossas ondas passarão a vibrar entre 7 e 3,5 ciclos por segundo - são as chamadas ondas theta. É comum que quando nosso cérebro passe a produzir esta freqüência nossa percepção do mundo externo fique bastante reduzida. Começamos assim a fechar os olhos do corpo e abrir os olhos da alma. Nesse momento é comum experimentarmos uma maravilhosa plenitude (mesmo que rápida), o chamado êxtase espiritual, que é seguido na maioria da vezes por um apagão de consciência quando surge a sensação de estarmos dormindo. O ideal seria experimentar essa freqüência cerebral com a consciência desperta, mas no início só conseguimos manter a consciência e suas funções (memória, atenção, aprendizado) estando com as agitadas ondas beta.

Um estado ainda mais profundo é produzido nas ondas delta, quando a freqüência cerebral passa a ser de 3,5 a 0,5 ciclos por segundos. O transe profundo é experimentado nesse estado, que é o estado de letargia, e somente os iogues conseguem manter a consciência plena com ondas inferiores a 0,5 por segundo.

Para entendermos o processo na prática, vamos observar o gráfico abaixo que indica o processo das ondas cerebrais durante a meditação. A representação mostra que a mente vilã sempre aparece quando estamos entrando em alpha, quando relaxamos, quase chegando em theta, experimentando a totalidade - momento onde a respiração é imperceptível, os batimentos cardíacos estão diminuídos, todo o nosso ser vibra numa grande coerência - física e energética. De repente surge um pensamento que nos arrasta subitamente para a superfície! A lembrança da conta que não foi paga, do telefonema que precisa ser dado, da luz que ficou acesa em casa e pronto! Lá se foi o êxtase espiritual, a plenitude e a maravilhosa experiência que parecia estar se aproximando. Voltando as ondas beta, o coração acelera, todo o corpo se prepara para agir, o diálogo mental se inicia - já que a mente associativa desencadeia uma série de associações e a simples lembrança da luz acesa já nos levou a uma série infinita de pensamentos até que estejamos novamente na superfície. Nesse momento não devemos desistir, pelo contrário. Focamos atenção na respiração e novamente sentimos o mergulho acontecendo.

A meditação é um exercício e permanecer cada vez mais tempo em alpha ou theta é apenas uma questão de prática. E com o tempo acessar essas ondas mais serenas torna-se ser possível em qualquer situação do dia-a-dia e não apenas no ambiente da meditação.

1) A mente beta- o diálogo interior é incessante, lembranças, imagens soltas, a atenção totalmente focada no ambiente externo. 2) Iniciando a meditação, focando a mente num ponto que pode ser a respiração, um mantra, um som, o estado alpha vai acontecendo, diluindo pouco a pouco a agitação, silenciando e tirando a atenção do mundo externo 3) Já com as ondas theta, experimenta-se o início da fusão com o ser interior, o silêncio, o contato com a fonte criativa, o espaço de infinitas possibilidades onde recarregamos as baterias e solucionamos problemas, não através da lógicas, mas de insights. Este estado pode durar segundos ou minutos até que... 4) a mente beta, inconformada em perder seu posto nos acena com uma lembrança, uma imagem, que pode surgir pela livre associação com um ruído externo ou interno, e em questões de segundos voltamos a "pensar" em beta.