Artigos

A RAZÃO DO MEU AFETO - ASTROLOGIA E A EXPERIÊNCIA DE AMAR

Alexey Dodsworth

Sou continuamente questionado a respeito do quê exatamente a astrologia pode fazer para tornar uma pessoa mais feliz. A maioria dos indivíduos vê o astrólogo como alguém dotado de poderes mágicos, capaz de mostrar a estrada dos tijolos de ouro que conduz à terra encantada de Oz e, sejamos francos, o mais difícil não é cumprir a expectativa do indivíduo que vê na astrologia uma espécie de fórmula mágica ou "manual de dez lições", o problema mesmo é tentar explicar que Oz é aqui, assim como Dorothy, o Homem de Lata, o Espantalho e a Bruxa Malvada do Oeste são aspectos de nós mesmos, continuamente em conflito, tentando encontrar um consenso. Todos nós temos incontáveis personagens dentro de nossas almas, e o mapa astrológico nos permite ler o roteiro de nossas lendas pessoais... e entender que personagens são esses que carregamos no mais profundo de nós mesmos.

Dentro do caleidoscópio de possibilidades contidas no mapa astrológico, a questão "relacionamentos" é uma das mais levantadas por todas as pessoas que buscam na astrologia uma fonte de conhecimento para alcance desta tão almejada "felicidade".

Apaixonar-se por alguém é uma faca de dois gumes, e ninguém precisa de astrologia para conhecer a ambivalência contida na experiência de amar e ser amado. Cair de amor por outra pessoa é uma experiência universal, e faz parte de nossa longa viagem de encontro a nós mesmos. É uma viagem excitante, adorável, angustiante e tenebrosa, pois o amor tem várias faces, e nem todas são luminosas. Para algumas pessoas, sobretudo aquelas com Vênus e Saturno aspectados em seus mapas, a experiência de dissolver-se no outro pode ser particularmente angustiante pois, na medida em que amam, sentem-se frágeis, expostas, temem viver a felicidade da entrega afetiva porque não suportam a idéia de uma possível rejeição. Só que é este medo da rejeição que cria o palco para a dor principal: do prazer não vivido por simples fobia Para outras pessoas, principalmente aquelas com Vênus e Netuno aspectados, a idéia de perder a identidade e amar acima de todas as coisas é mais do que uma fantasia: parece ser um objetivo de vida. Elas anseiam pelo sono entorpecente que ocorre quando nos apaixonamos, e ficam chocadas quando percebem que a história não acaba quando o príncipe beija a princesa. Há também o dia-a-dia que ninguém conta nas fábulas, com cabelos desgrenhados e olhos remelentos ao despertar, há as contas a pagar e toda uma quota de "elementos de realidade" que cortam o barato das pessoas Vênus-Netuno.

Sobretudo, é importante compreender que não existe vida sem amor. Amor e morte - os deuses Eros e Tanathos - são as únicas coisas de fato eternas neste nosso universo de impermanências. Há amor em tudo, permeando tudo, átomos se amam formando moléculas e, desta forma, não há nada no universo criado que não seja uma manifestação viva do arquétipo do amor. E isso, longe de ser uma idéia piegas, é pura química. E as relações humanas são como química: algumas pessoas reagem conosco e novas substâncias surgem daí. Outras nos são quimicamente neutras, mas a qualidade da transformação por reação química é inevitável. Cedo ou tarde acontecerá a você, a mim, a todos nós, por mais que você decida, fundamentado numa decepção temporária (sobretudo se tiver passado por um trânsito Saturno-Vênus ou Plutão-Vênus) que "nunca mais amará novamente". Amar novamente é inevitável, mesmo que não seja mais um amor sexual, um amor "romântico". Amar de novo e de novo é tão certo quanto o Sol nasce todos os dias no leste e se põe no oeste. É uma lei da natureza, tão poderosa quanto a gravidade, tão misteriosa quanto a vida e tão inexorável quanto a morte.

A astrologia é, enfim, um instrumento que nos permite qualificar os relacionamentos. No que tange à arte astrológica, esqueçam esta bobagem de quantificações e percentualizações. O amor não se computa. Não existe isso de 75% de chance de dar certo. Todo amor que existe é sempre 100% dentro daquilo a que ele se propõe. Pode ser uma relação de 20 anos, 2 anos, 2 meses ou de 20 dias, se há amor neste tempo, se há reação química, há transformação. Ao final do relacionamento, ambas as partes sairão de algum modo transformadas, ainda que não percebam isso de imediato. Mas ninguém esquece do amor que existiu - mesmo o que dura apenas alguns dias ou meses. Trazemos um pouco dos outros em nossas memórias mais recônditas.

Quem compreende isso se torna profundamente grato por toda experiência, relacionamento, por todos os encontros humanos, mesmo aqueles onde o amor assumiu a estranha roupagem de "inimizade", mesmo por aqueles relacionamentos que duraram tão pouco, ou por aqueles que não terminaram tão bem. Compreender que há um sentido oculto por detrás de cada contato - e é esta compreensão que a astrologia nos lega - é o primeiro passo para perceber que tudo isso está te conduzindo para você se tornar quem você verdadeiramente é. Do início até o fim, a vida é uma grande jornada de encontro a nós mesmos, e nossos relacionamentos são reflexos das transformações que nossa alma vivencia. Portanto, é essencial compreender que nenhuma relação é o objetivo final da vida de ninguém. Librianos podem ficar irritados comigo lendo isso, já que uma grande parte de pessoas muito librianas terminam sendo demasiadamente orientadas para relacionamentos, mesmo quando não estão de fato preparadas para isso, mas mesmo eles sabem que o que estou falando não é tolice. O relacionamento não é o pouso final, é a estrada. E o amor é muito mais do que um relacionamento. O que vivemos em nossas relações, por mais "perfeitas" que temporariamente sejam, é uma partícula, como o feixe de luz de um grande holofote.

A longa viagem de encontro a si mesmo pode ser uma jornada consciente ou mesmo uma trilha inconsciente. E o fator modificador é como vivemos nossos relacionamentos. Você pode ser uma pessoa criada tão simplesmente pelas reações ao que te fazem, uma vítima das circunstâncias, ou assumir a responsabilidade por tudo aquilo que você atrai pra sua vida. E a qualidade do que você atrai está diretamente ligada à qualidade do que você projeta, e por isso que é tão importante compreender o signo descendente.

A massiva maioria das pessoas inconscientes se foca na idéia de "receber amor", e ficam desta forma reféns de uma felicidade fundamentada em algo externo, tão falsa e temporária quanto um filme piegas de classe B. Quando você opera neste nível (e isso pode acontecer com qualquer indivíduo com qualquer mapa astral), seus casamentos se tornam inevitavelmente futuros inimigos declarados (o outro significado da sétima casa). Porque tudo aquilo que não é internalizado torna-se um antagonista. E é fato que a consciência focada em receber amor, na verdade sente é fome, carência, desejo. Porque o amor por si só se basta. Mesmo quando não correspondido, se o que sinto é real, operará uma transformação em mim mesmo. E é o "eu" o escopo final de toda experiência amorosa.

O fato é que a própria idéia de uma "cara-metade" é a origem de quase todos os males dos relacionamentos. Ao acreditarmos que alguém é nossa "outra metade", preenchemos a pessoa de expectativas e projeções que não equivalem à realidade e plenitude de sua existência. Na verdade, reduzimos o outro a uma caricatura, a um arremedo de nossas fantasias inconscientes. Se você tem Vênus aspectando Netuno em seu mapa, deve saber muito bem do que estou falando.

Um relacionamento, para ser plenamente funcional, deveria ser o encontro de duas pessoas inteiras, que se cruzam para trocar experiências e somar. Dois círculos inteiros que, juntos, formam o símbolo do infinito. Imaginar o outro como "minha metade" é reduzir-se, é injusto para com a inteireza e o mistério profundo que são o outro. E amar, mais do que ir ao cinema, rir e comer pipoca, é morrer simbolicamente: é deixar cascas, é matar o velho eu. E não é à toa que a oitava casa astrológica (da morte) se sucede à sétima (do encontro alquímico). Mas isso é conversa de Plutão, e por enquanto - pelo menos neste mês de junho, tão impregnado de romantismo graças ao dia 12 - fiquemos com as doçuras românticas de Vênus, que sempre valem a pena, ainda que durem 20 anos, 2 anos, 2 meses, 20 dias... ou dois minutos! Porque até o olhar cruzado no meio da rua, aquele olhar que nunca virou encontro, até isso te transforma.

O EIXO ASCENDENTE-DESCENDENTE

Nós manifestamos a nossa existência através de nosso signo ascendente, mas é através do descendente (o signo oposto ao do ascendente) que nós desenvolvemos um senso de quem somos. É através do outro que tomamos consciência de nossas naturezas. Só sabemos do que somos capazes, de nossas qualidades e defeitos, por intermédio do espelho que é o outro.

O ascendente sinaliza a força que nos move na direção das coisas, é a expressão primeira da nossa identidade. O signo ascendente revela o que lançamos para o mundo e, por conseqüência, representa também a forma como os outros nos vêem. Tecnicamente falando, "ascendente" é o signo que se encontrava no horizonte leste no momento de nosso nascimento. O conhecimento do signo ascendente depende da precisão da hora de nascimento fornecida para composição da carta astrológica. Já o descendente é o signo oposto ao ascendente, ou seja, é o elemento zodiacal que se encontrava no horizonte oeste no momento de nossa vinda ao mundo. Este signo - chamado "descendente" - é o depositório de nossas projeções. Representa o que buscamos no outro, as qualidades que almejamos com a finalidade de alcançarmos a nossa inteireza perdida.

Se traçarmos uma linha entre o ascendente e o descendente, obteremos exatamente a chamada "linha do horizonte". E é esta linha que separa a parte superior do mapa (consciente) da parte inferior (inconsciente). Podemos então dizer que a dilemática questão "eu" X "os outros" é exatamente a zona fronteiriça que cria a ilusão da dualidade entre consciente e inconsciente. O outro é, assim sendo, um espelho: quando colocamos alguém na posição de parceiro (seja sócio, marido/esposa ou mesmo um inimigo que odiamos), criamos aí o palco para todas as nossas projeções... no bom e no mau sentido.

O ascendente em Áries expressa e clama ao mundo a singularidade de sua existência. Mas busca em sua relações, por conta do descendente em Libra, o seu ponto de equilíbrio. É através do outro que ele ajusta sua própria identidade, é a partir das relações interpessoais que ele consegue encontrar uma harmonia - ainda que temporária - e encontrar um canal de aproveitamento para toda sua dinâmica inspiração de vida. Já o ascendente em Libra vê a si mesmo como harmonioso e detentor do equilíbrio racional, mas é em seus relacionamentos que ele encontra a força e o senso de iniciativa para dar impulso ao que ele intelectualmente idealiza. Tudo isso por conta do Áries descendente.

No caso do ascendente ariano que não aprende a encontrar harmonia (Libra) em si mesmo, há o risco de se ficar dependente dos outros, precisando sempre deles como sinalizadores do que precisa ser ajustado. O libriano ascendente que não consegue descobrir a iniciativa (Áries) em si mesmo corre o risco de ficar sempre precisando da força que vem do outro, do impulso que o outro dá, e termina ficando com raiva por sentir que não faz valer a própria força.

Touro ascendente, que geralmente transmite a atmosfera de ser um poço de estabilidade e firmeza, atrai a qualidade de Escorpião descendente. Por Touro ascendente nada nunca muda, tudo pode ficar do jeito que está. O que é maravilhoso ele preserva, o que é terrível ele simplesmente suporta. É através dos relacionamentos que ele descobre que transformar é preciso, são as - muitas vezes conturbadas - relações do taurino ascendente que o levam a sair da estagnação e acelerar o passo. No caso do ascendente em Escorpião, a intensa e passional natureza do indivíduo busca angustiadamente a estabilidade que as relações podem, em tese, fornecer. É através das relações afetivas que este ascendente, por conta de Touro descendente encontra um mínimo de estabilidade e firmeza para descansar sua alma extremista.

Há o risco, entretanto, da pessoa de Touro ascendente não aprender a realizar mudanças por si mesma. Deste modo, a energia escorpiana descendente torna-se "inimiga", e as relações do ascendente Touro viram uma novela mexicana de ciúmes, controle e angústia, reflexos do descendente em Escorpião mal-trabalhado. E o ascendente em Escorpião que não aprende com o tempo a encontrar a estabilidade em si mesmo, dependendo sempre do outro para isso, corre o risco de ficar atado a relações estagnadas, que nada acrescentam, por puro comodismo. Resultado do lado mal-vivido do descendente em Touro.

Gêmeos ascendente tem uma qualidade inquisitiva e mentalmente arejada que transmite ao mundo, mas como Gêmeos costuma ser um ponto de interrogação ambulante, levantando dúvidas até quando já sabe a resposta, termina precisando dos relacionamentos para entender que a vida não é só especulação mas, sobretudo, é aventura, paixão e... fé. Nem tudo tem que ser "explicadinho". E é isso que Sagitário descendente, por intermédio das relações, vem ensinar a Gêmeos ascendente: os relacionamentos deste tipo surgem para mostrar ao indivíduo que há mágica e mitos no mundo, pronto para serem descobertos quando o mental concreto relaxa. Por sua vez, a pessoa de Sagitário ascendente, plena de vida, aventura e paixão, cheia de certezas intuitivas, de fé e de respostas - certezas e respostas que muitas vezes tornam a pessoa precipitada e radical -, termina precisando de relacionamentos com a qualidade de Gêmeos descendente, que a façam pensar, especular, duvidar, "ver o outro lado das coisas". Por isso mesmo a coisa que mais fascina o ascendente em Sagitário é a inteligência do outro. Entretanto, a pessoa de Gêmeos ascendente que não consegue encontrar um sentido mais espiritual para a vida por si mesma corre o risco de vivenciar relacionamentos que sempre lhe escapam... correm para longe, com as longas pernas do centauro sagitariano. E ao se ver forçada a ir para lá e para cá por conta de suas inconstantes relações, a pessoa geminiana ascendente vive o lado negro do descendente em Sagitário: uma vida de inconstância. Por sua vez, a pessoa de Sagitário ascendente que não aprende a pensar melhor por si mesma, a refletir e duvidar de suas próprias certezas fanáticas, vê-se embrulhada num saco de relacionamentos instáveis, atraindo-se por pessoas que parecem não querer crescer nunca. Só gostam do que é infantil. O ascendente em Câncer, pura emotividade e afeto transmitidos livremente, necessita dos relacionamentos para assimilar os conceitos de estabilidade, firmeza e responsabilidade. Por conta do descendente em Capricórnio, este indivíduo encontra no outro o seu lastro firme, e por isso necessita de relacionamentos estáveis. Já o ascendente em Capricórnio, geralmente tão duro, responsável e ciente de suas responsabilidade, tem profunda necessidade de encontrar ternura e carinho em seus relacionamentos. Devido à presença de Câncer descendente, o tipo capricorniano ascendente encontra a própria ternura que há enterrada em si mesmo através de suas relações íntimas.

Só que o ascendente em Câncer que não aprende a encontrar a firmeza e lastro que tanto necessita em si mesmo termina vivenciando relações frias, com pessoas que dão afeto em doses homeopáticas, como que para forçar o canceriano ascendente a não depender de ninguém para encontrar sua segurança emocional. E o ascendente em Capricórnio que não aprende a viver seu próprio afeto, expressando-o e vivendo-o, termina vivendo ou preso no passado, em relações que já se foram mas ele não se desliga, ou relacionando-se com pessoas piegas, quase "mães", num tipo de relacionamento que está mais para o de mãe carinhosa e filho arredio do que para as belezas da relação a dois.

Leão ascendente veio para este mundo a fim de transmitir sua notável criatividade. Expressando a plenitude de sua individualidade, este tipo inspira nos outros a coragem para serem eles mesmos. Consciente de si, sobretudo daquilo que ele pode fazer, Leão ascendente precisa aprender, através de suas relações, que nada existe apenas, pura e simplesmente em função dele. E isso é ensinado pelo descendente em Aquário: ao se relacionar, ele aprende - através do outro - que o mundo é cheio de gente diferente, e que ele não é - por mais que creia nisso - unanimidade! Por outro lado, as pessoas de Aquário ascendente vieram a este mundo para revolucionar completamente os conceitos tradicionais que a massa humana aceita de forma passiva. Só que, através desta postura demasiadamente intelectual e abstrata, correm o risco de perder o calor humano, o calor do coração, que resgatam através de seus relacionamentos com pessoas mais amorosas e cheias de vida - graças ao descendente em Leão.

O problema, muitas vezes, é que a pessoa de Leão ascendente pode não aprender a lição que seus relacionamentos têm a ensinar: a respeitar um mundo democrático, em que nem tudo que ele acha é a lei. Quando o leonino ascendente não aprender a importante lição da democracia, seus relacionamentos podem terminar subitamente, fulminados pelos raios de Urano. A pessoa de Aquário ascendente, por sua vez, se não aprender a encontrar mais alegria e vida em si próprio, pode terminar se relacionando com verdadeiras estrelas egocêntricas que mal notam suas verdadeiras necessidades emocionais mais profundas. Gente que só pensa em si.

Virgem ascendente tem a oferecer um senso maior de razão na vida. Dotado de uma aguda e detalhista inteligência, é graças a este tipo que o mundo evolui, se aperfeiçoa tecnicamente. Mas é através de seus relacionamentos, graças ao Peixes descendente que este tipo relaxa o extremo controle mental que tem em relação a tudo, e se permite nadar nos mares do romantismo, que imprime mais vida a um intelecto muitas vezes árido. Por sua vez, a pessoa de Peixes ascendente oferece ternura, compaixão e, sobretudo, compreensão. É graças à existência de gente com Peixes no ascendente que a vida é mais suportável: você pode contar absurdos, mas ele lhe entenderá, com sua notável capacidade de compreensão. Entretanto, este tipo necessita de mais organização para sua vida pessoal, de mais ordem, de mais disciplina, que ele encontra em suas relações, que terão uma qualidade virginiana - uma vez que é este signo terrestre que estará no descendente de quem tem Peixes ascendente.

Entretanto, se a pessoa de Virgem ascendente não consegue desenvolver maior flexibilidade e expressão afetiva dentro de si mesmo, estará fadado a apaixonar-se por gente confusa e louca, pessoas cujas vidas caóticas insistirão em desorganizar a vida organizadinha do ascendente virginiano. E o pisciano de ascendente, por sua vez, se não aprender a, sozinho, organizar a própria vida, terminará se relacionando sempre com tiranos da ordem, tão chatos que doem.