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AÇÃO, REAÇÃO E AMOR

Paula Salotti

Cena 1: Um casal estava numa padaria e ele pediu 4 pãezinhos ao balconista entregando a ficha que havia retirado no caixa. O balconista, mau humorado e displicente, ignorou o pedido. Ele pediu novamente os pães, que foram entregues pelo balconista com um gesto agressivo. O casal saiu da padaria - ele comendo um pedaço do pão quentinho, elogiando o sabor e feliz - o que fez com que ela imediatamente comentasse: "Eu não te entendo! Com tamanha malcriação, você não foi capaz de reagir?" Ao que prontamente ele respondeu: Ora, eu prefiro apenas agir! E seguiu feliz, saboreando o seu pão quentinho...

Cena 2: Nora e sogra viviam juntas em péssimo relacionamento. Um dia não suportando mais o convívio, a nora procurou um médico amigo e narrou a situação. Ele prontamente lhe disse: "Vou lhe dar um remédio que matará sua sogra aos poucos. Mas enquanto isso você terá que tratá-la muito, muito bem, com carinho e amor, até que o efeito apareça. E a nora motivada, começou a tratar a sogra com o máximo de carinho, dedicação, ternura, até que sem perceber trocavam gentilezas, afetos, confidências. A sogra passou a sentir na nora a filha, a nora na sogra, a mãe. Um belo dia, ao se dar conta do sentimento que surgiu espontaneamente, a nora desesperada foi ao médico e disse: "Doutor, eu preciso urgente de um antídoto! Descobri uma pessoa que eu nunca havia conhecido, estou tendo o carinho que a vida nunca me deu." Ao que o médico com um sorriso retrucou: "Pode ficar tranqüila... em nenhum momento eu lhe dei um veneno! O remédio que eu lhe indiquei foi o amor que estava aprisionado em seu coração!!!

Pare e pense, reflita sobre o seu dia de hoje. Tente perceber quantas vezes você agiu. Agiu por iniciativa, com a alma, com o coração, pela sua vontade. Pense também quantos dos seus atos foram meras re-ações. Surpresos?

Em qualquer momento, em qualquer situação da vida temos apenas duas opções: agir ou reagir. E parece que na maioria das vezes escolhemos sempre a segunda opção.

Sem perceber, nos habituamos apenas a reagir passivos diante de tudo e todos que a vida coloca em nosso caminho, preocupados sempre com a nossa defesa e imagem, com a vitória final.

Na astrologia dois arquétipos representam esses estados de ação e reação. São eles Marte e Lua, que simbolizam nossa capacidade de agir, iniciar a ação, criar a ação - criação - Marte, e nossa resposta a toda a ação já criada, Lua.

A Lua fala de todo movimento reativo do nosso ser. Quando estamos para baixo, mergulhados em crises emocionais, carentes, frágeis e vulneráveis, parece que todas as questões lunares mal resolvidas estão a flor da pele, todo espaço que sentimentos nunca conseguiram preencher, todo o maltrato que a vida insistiu em despejar em nossa alma, traumas, angústias, complexos de inferioridade e insegurança, tudo isso pode ser acionado com um simples toque de alguém que cruze o nosso caminho. Acionado com um gesto, um olhar, uma palavra, que imediatamente usaremos como pretexto para entrarmos na submersão emocional, dominados por sentimentos que sequer conhecemos. Tudo que jaz sob nossa poderosa personalidade consciente pode ser convidado para aflorar, aparecer. Nesses momentos de extrema fragilidade, qualquer comentário, olhar atravessado, palavra mal-dita, desperta em nós uma fúria assassina, o ímpeto incontrolável do revide. Aquela resposta atravessada do balconista, o olhar de desprezo de quem se ama, um simples descaso... e pronto! Foram acionadas todas defesas, guardiãs dos complexos e rejeições. E reagimos, perdendo por completo o contato com a autonomia do nosso ser, com o nosso lado apto a iniciar a história, a criar situações, a ditar o rumo da vida. Perdemos a chance de sermos os condutores da vida, motoristas do próprio destino.

Para que sejamos esses condutores é preciso estarmos conectados com a dimensão mais dinâmica do nosso ser. Escolher o caminho da criação é escolher a sintonia com o nosso centro, o nosso eixo, que mesmo exposto as intempéries da vida, jamais poderá ser abalado. Quando desconectados dessa dimensão, aceitamos entrar num interminável jogo que só trará aprisionamento e servidão a uma natureza sombria, cuja principal função é bloquear o caminho da luz, da consciência. Sim, porque este ser submerso que nos faz reagir, estas motivações e defesas a espreita no subconsciente, estão prontas a assumir o controle a todo momento.

O Eu que apesar das provocações, descasos e desprezos vindos do mundo externo, consegue estar alinhado e comprometido com o seu equilíbrio, com o seu desejo, com a sua história, vai abrindo novos caminhos, sendo autor da sua vida. O compromisso com o nosso lado mais dinâmico, atuante, vibrante, que vive o aqui e agora, que percebe a plenitude de cada momento e sabe que em suas mãos estará sempre o seu amanhã. Em cada ação, palavra, postura, a semente do que encontrará pelo caminho nas próximas horas...

E para assinarmos esse compromisso é preciso que o caminho do coração seja escolhido. Sim, somente aquela energia capaz de agregar, unir, reunir, juntar pedaços, curar, fortalecer, apaziguar poderá trazer a força necessária. Energia que hoje em dia é muitas vezes banalizada, por não assimilarmos a grandeza do seu significado, ou por tentarmos produzi-la com a mente.

Chamamos essa energia de Amor. Energia que quando presente nos envolve com total proteção, conforto, desprendimento. Cura qualquer mal, do corpo e da alma, nutre e alimenta todo vazio, preenche todos os espaços. E somente o estado amoroso da alma será capaz de criar a sintonia com a dimensão maior do nosso ser. Alguém já viu um ser verdadeiramente apaixonado sequer perceber alguma agressão? O êxtase do estado amoroso é capaz de fazer qualquer um passar por cima da pior provocação - ao contrário - é ainda capaz de fazer com que achemos graça, e continuemos seguindo em direção ao infinito, felizes, plenos, já que o que nos alimenta nesse estado é a fonte inesgotável de amor que existe no universo. A conexão com essa fonte - a grande cura - nos faz recuperar nosso centro, nosso eixo.

E acessamos esse centro quando de verdade reconhecemos que tudo e todos que cruzam nosso caminho nada mais são do que espelhos e instrumentos da nossa evolução. Acessamos esse centro quando reconhecemos que todos que um dia estiveram ao nosso lado, vieram para despertar em nós o que sempre em nós esteve, mas sozinhos, éramos incapazes de despertar. Acessamos esse centro quando sentimos gratidão profunda por todos aqueles que conosco estão ou estiveram, nos fazendo sorrir, amar, brilhar. E especialmente, acessamos esse centro quando essa infinita gratidão é sentida por todos que vieram e nos fizeram sofrer, chorar, perder. Sim, a esses uma gratidão especial, profunda, pois nesse momento, reconhecemos que sem suas passagens por nossas vidas, jamais teríamos tido as oportunidades de nos tornarmos o que somos hoje, jamais teríamos escrito nossa história, jamais teríamos tido a real dimensão da nossa força e poder.

Permitir que o amor transborde em cada gesto, palavra. Perceber que esse amor já existe em toda criação, já está presente. Basta que seja convidado. Convidado com a ação sempre amorosa, geração das sementes de amor que serão espalhadas ao infinito.