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ASTROLOGIA, CARMA & PSIQUE

Claudia Araujo

De uma certa forma todos nos embaraçamos com a palavra carma e ao evocarmos essa palavra sempre nos sentimos adentrando num terreno metafísico e perigoso. No entanto, essa palavra possui conotações específicas para o psico-astrólogo cármico e, por isso, ele dela se utiliza, mesmo sabendo que a mística sobre a reencarnação antecede o conceito de carma.

Sabemos que a teoria da reencarnação é uma filosofia que defende a idéia de que a alma humana passa por diversas etapas de evolução, e que para que essa evolução ocorra é necessário que a alma reencarne quantas vezes se fizer necessário até que atinja o seu pleno desenvolvimento. E que é só a partir daí que surge a idéia de carma, se referindo à lei de causa e efeito que nortearia o nosso plano de vida e metas para as diversas existências.

Dentro dessa ótica, a alma expandiria continuamente sua consciência através da soma de experiências vividas até que não fosse mais necessário encarnar num corpo físico. Ou seja, essa proposta visaria o aperfeiçoamento da alma e, conseqüentemente, o aperfeiçoamento do ser humano. Assim, nós determinaríamos e programaríamos todas as experiências de vida e teríamos oportunidades de melhorar o padrão criado. Isso coincide de maneira incondicional com a psicologia analítica, assim como coincidia com a visão da alquimia, onde a obra divina - o homem - poderia se aperfeiçoar, desde que houvesse um real empenho.

A psicologia analítica entende nosso processo de autoconsciência como sendo nossa verdadeira libertação, além de entender isso como uma meta e plano de vida e da mesma forma que a astrologia cármica identifica núcleos ou padrões constelados num mapa astrológico como resíduos de experiências de vidas anteriores, a astrologia baseada numa ótica psicológica, cármica ou não, identifica esses mesmos padrões no mapa, como tendências inconscientes a que fiquemos repetindo os mesmos padrões de comportamento, que fatalmente nos levarão a resultados que fugirão ao nosso controle.

Os reencarnacionistas afirmam que embora muitos de nós não tenhamos lembranças conscientes de vidas passadas, nós atuamos segundo os padrões definidos em outras vidas sem percebermos como e porque, e o fazemos de forma inconsciente. Os complexos psicológicos atuantes em nossa psique nos levam a adotar padrões de comportamento similares e, na maioria das vezes, não estamos conscientes deles, embora eles nos levem a atuar nessa ou naquela direção.

A astrologia, defendendo a idéia de que o interior e o exterior se refletem mutuamente e fazem parte integrante do todo, entende que os princípios simbolizados pelos planetas estão também representados na Terra, assim como no corpo humano e na psique. Nascemos num momento e num local específicos, que refletem uma qualidade específica, qualidade essa que está marcada pela presença planetária no céu, assim, como se encontra marcada no ser humano por sua constituição física e psicológica.

O mapa astrológico, então, é o mapa do nosso desenvolvimento psicológico, da dinâmica que se processa em nosso inconsciente. Ele é um mapeamento de tudo aquilo que jaz em nosso aparelho psíquico e cuja interação, dinâmica e conflitos, visam nosso auto-desenvolvimento, tornar-nos um ser único, individuado, o ouro alquímico. Para isso, é preciso que nossos defeitos sejam reconhecidos, devidamente transformados e nós, enquanto indivíduos, aperfeiçoados. A consciência é a base para o nosso crescimento.

Quer tenhamos uma visão reencarnacionista ou simplesmente tenhamos uma leve noção do carma, ou, ainda, tenhamos uma visão psicológica do conteúdo da astrologia, o que foi constatado através de pesquisa realizada em cima de inúmeros atendimentos é que existem certos pontos no mapa natal que desempenham um papel preponderante para o atendimento e orientação astrológica. Esses pontos nos falam de uma certa fatalidade, um certo padrão de comportamento repetitivo que, se inconsciente, nos levará a fracassar na busca por nosso aperfeiçoamento.

A psico-astrologia cármica visa o reconhecimento desse material e seu posterior aperfeiçoamento. Nesse contexto, o homem estaria apto a se desenvolver, não só como ser humano, mas espiritualmente, pois na medida em que aprende a lidar com seu destino, torna-se responsável por si mesmo, chegando a recuperar alguma parcela de seu livre-arbítrio. Isso é contrário à idéia de que o destino é imutável. O destino existe, mas é o grau de consciência adquirido que nos levará a nos libertar do seu caráter inexorável.

Assim, a psico-astrologia cármica não nos revela aquilo que fomos na última encarnação, mas nos fala daqueles condicionamentos que costumam se repetir e que, por estarem inconscientes, acabam se tornando os responsáveis por nosso "destino".

Não há como se fazer uma distinção entre os resíduos cármicos e os complexos psicológicos atuantes em nossa psique. Se buscarmos o "depósito" onde se localizam esses materiais, este seria o inconsciente, onde repousam inclusive os padrões do inconsciente coletivo, qual seja, a memória e o conjunto de experiências comuns a toda a humanidade, cujo exemplo muito conhecido são as diversas mitologias, assim, como nossas experiências de vida, e ainda o que se poderia chamar de resíduos cármicos ou experiências de vidas anteriores.

Há algum tempo atrás, na Rússia, foi elaborada uma pesquisa em que os cientistas afirmaram que assim como possuímos um código genético familiar, possuímos uma herança psicológica familiar, onde estariam registradas todas as experiências de nossos ancestrais, desde o primeiro casal do qual tivemos origem. E disseram ainda que nesse código todas as experiências vividas por esses que nos antecederam - pais avós, bisavós, tetravôs, etc - estariam registradas nesse "depósito", que, mais uma vez, nada mais é do que nosso inconsciente.

O que a psico-astrologia pretende é trabalhar o indivíduo de forma a que ele possa se transformar e resolver essas questões que vêm se repetindo e obstando seu crescimento, não se importando em que camada da psique elas se localizem.

Na tradição hindu, samskara significa tendência ou disposição. Um samskara, portanto, é o que nos leva a repetir determinadas experiências; é o próprio padrão central, o núcleo da experiência cármica. Se ficarmos presos ao samskara, não poderemos almejar nossa evolução. Da mesma forma, se nos deixarmos aprisionar pela repetição dos padrões arquetípicos inconscientes, não poderemos almejar jamais nossa individuação, ou em outros termos, nossa totalidade e autonomia psíquicas.

É cada vez mais evidente que todos os complexos importantes que estruturam nossa vida e determinam nossas interações pessoais já estão formulados na hora de nascimento (mapa natal). Somos os herdeiros de resíduos, tanto cármicos, quanto pertencentes ao inconsciente coletivo, ou mesmo à nossa constituição genética-familiar. De acordo com esses padrões constelados no mapa, somos atraídos pelos arquétipos do inconsciente para que vivamos determinadas circunstâncias. Quando tomamos consciência destas questões, podemos descobrir que não precisamos mais estar amarrados à compulsão inconsciente do samskara, ou sermos vítimas da nossa sombra, mas que podemos ser os verdadeiros condutores de nosso destino.

Buscar nosso aperfeiçoamento e transformação é a via régia de nossa vida, e empreender essa busca com o cliente, é partir em direção ao Cálice Sagrado, ao Santo Graal, que é o ouro na alquimia, o sentido de Self na psicologia junguiana e o verdadeiro encontro com Deus, não mais projetado, mas internalizado em cada um de nós.

Claudia Araujo ministra cursos de astrologia, psicologia junguiana e mitologia. É responsável por vários cursos na Internet onde modera listas de discussão relacionadas a estes temas.