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TRANSCENDÊNCIA E TRANSGRESSÕES
Quando se rompem os limites impostos por Saturno

Valdenir Benedetti

O raciocínio astrológico se origina de uma situação relativamente simples, que é a observação concreta da natureza, partindo-se do princípio que o que vemos fora de nós existe também dentro de nós. Quando observamos o dia e a noite se relacionando dinamicamente, se fundindo e alternando, percebemos que esta relação dinâmica existe também interiormente nos seres vivos; só mudamos o nome para consciente e inconsciente e transportamos para o plano da psique e do comportamento. É apoiados nesta relação visual e imediata que atribuímos significados aos planetas e às relações cíclicas entre os referenciais celestes e as situações terrestres.

O Sol, por exemplo, simboliza o dia, o consciente; já a Lua simboliza a noite e, por analogia, o inconsciente. Saturno representa os limites, pelo simples motivo de ser o último planeta visível a olho nu, e podemos considerar que, de um modo geral, o ser humano apenas se permite ir até onde alcança sua visão. O que está além dela é considerado sonho, ideal, delírio, espiritual, transcendental, etc. A grande fronteira do homem passa a ser, dentro deste modelo, o alcance do olhar.

Sabemos que existem três planetas conhecidos além dos limites de Saturno: Urano, Netuno e Plutão, que representam justamente as qualidades naturais que se encontram além da estrutura formal e conhecida de Saturno, como os poderes paranormais e a capacidade de cura e auto-cura, entre outras tão elogiadas pelos cultores da "Nova Era". Estes planetas simbolizam também as qualidades negativas de quem quebrou as barreiras da estrutura, as aberrações, distorções e anomalias de quem perdeu a noção dos limites e os rompeu de uma forma inadequada.

Como se sabe, o Ascendente é o ponto central e gerador de todo o horóscopo, onde o fim e o começo se encontram, onde a grande serpente morde a própria cauda. O Ascendente representa a vocação fundamental, a forma e os conteúdos básicos do indivíduo, o motor e o combustível a serem usados no desenvolvimento e na execução do projeto de vida de cada um. A partir disso, podemos concluir que qualquer configuração ligada ao Ascendente (ou à Casa-1) interfere diretamente nas direções que a pessoa segue na vida, na orientação de sua existência e nas experiências formadoras do caráter e da personalidade.

Quando os planetas transaturninos ou os signos que eles regem fazem qualquer contato com o Ascendente, isto parece significar que no projeto de vida desta pessoa estão implícitas algumas ligações com a realidade invisível, com experiências que estão além de Saturno, além da estrutura social como a conhecemos.

Todos temos Urano, Netuno e Plutão em algum lugar de nosso mapa natal, como também temos em alguma casa os signos por eles representados - Aquário, Peixes e Escorpião - e isto significa que todos nós estamos naturalmente aptos a vivenciar e projetar, em alguma área de nossas vidas, os significados destes símbolos. Mas quando estes representantes do mundo invisível, da realidade que existe além da percepção formal, estão em contato com o Ascendente, eles impõem uma condição de superação dos limites saturninos ao nosso projeto de vida, e isto interfere com a formação de nossa personalidade e com os caminhos que, consciente ou inconscientemente, escolhemos seguir.

Vamos considerar que todos temos um potencial para superar os limites das estruturas, pessoais e sociais, tanto quanto temos os representantes das possibilidades transaturninas em algum lugar de nosso mapa natal. Vamos considerar também que, proporcionalmente à intensidade da relação destes planetas com a questão "1" (um) do nosso mapa (Ascendente, Casa-1 e seus indicadores) advém o potencial de transgredir ou transcender os limites representados por Saturno.

Podemos estabelecer então um valor médio de capacidade "trans" para todas as pessoas, digamos 5 (cinco) numa escala de 0 a 10 (zero a dez). Neste sentido, vamos agora definir algumas regras de avaliação e ponderação deste potencial a partir de elementos básicos de interpretação astrológica. As regras a seguir são conjecturas e podem ser questionadas e atualizadas, como qualquer outra regra astrológica; portanto, não são definitivas e nem representam qualquer lei. Existe uma hierarquia entre elas que se apóia nos princípios clássicos da interpretação, especialmente na "Teoria das Determinações" conforme foi elaborada por Morin e, por isso, o estado cósmico e a natureza dos planetas envolvidos devem ser considerados:

1)- Urano, Netuno ou Plutão no Ascendente ou Casa-1: acrescentar 1 ponto. Se estiver em conjunção com o Ascendente, somar 1,5 ponto.

2)- Urano, Netuno ou Plutão dispondo do Ascendente (regendo o signo ascendente): acrescentar 1 ponto.

3)- Urano, Netuno ou Plutão em casa angular: acrescentar 1 ponto.

4)- Urano, Netuno ou Plutão em conjunção com o regente do Ascendente, com o Sol ou com a Lua: acrescentar 1 ponto.

5)- Urano, Netuno ou Plutão em aspecto maior (quadratura, trígono, oposição) com o regente do Ascendente, o Sol ou a Lua, em orbe de no máximo 4 (quatro) graus: acrescentar 0,5 ponto.

6)- Urano, Netuno ou Plutão regendo o signo da Casa-1, mas não o Ascendente: acrescentar 0,5 ponto.

7)- Urano, Netuno ou Plutão dispondo do regente do Ascendente, do Sol ou da Lua: acrescentar 0,5 ponto.

Quem estiver dentro da média, provavelmente terá uma facilidade maior de adaptação à realidade social, mas tem dentro de si o potencial para romper os limites que lhe são impostos, particularmente aqueles que o impedem de se tornar alguém maior, melhor, mais especial.

Quem tiver em seu mapa um ou mais pontos acima da média é uma pessoa que tem maior facilidade de transcender ou transgredir; tem a opção de romper com os limites saturninos, criar novas realidades, propor novas alternativas. Algumas pessoas podem assumir este potencial com revolta, amargura, vontade de transformar a realidade social através da agressão ou destruição. Outros podem optar pela transgressão moral. E existem também aqueles que podem se iluminar e iluminar amorosamente os que estão à sua volta. A escolha do caminho é prerrogativa do indivíduo, pois não acredito que exista qualquer indicação no mapa que conspire para a infelicidade e pobreza espiritual. Usar bem ou mal o mapa é uma escolha: a sua escolha!